É sabido que a obesidade, definida por um índice de massa corporal (IMC) maior ou igual a 30 kg/m², durante a gestação tem consequências negativas, a curto e longo prazo, tanto para a mãe quanto para o bebê.
♦ Para começar, a obesidade reduz a fertilidade. Mulheres acima do peso que conseguem engravidar apresentam maior risco de aborto espontâneo e de malformações congênitas (fenda palatina, defeitos na formação da medula espinhal e defeitos estruturais no coração).
♦ Ainda, durante a gestação, mulheres com excesso de peso apresentam aumento na resistência à ação da insulina que se manifestará na metade para o final da gestação como diabetes gestacional e crescimento fetal exagerado (bebê com peso ao nascimento superior a 4 kg ou acima do percentil 90 para a idade gestacional).
♦ No parto, o risco de cesariana e de sangramento excessivo aumenta significativamente.
♦ Após o parto, aumenta o risco de tromboembolismo venoso, dificuldade na amamentação e retenção de peso.
♦ Já o recém-nascido de mães acima do peso nasce com maior percentual de gordura corporal, com risco aumentado de obesidade na infância.
Diante dos principais riscos acima descritos para a mãe e para o bebê, surge frequentemente a pergunta no consultório: "Posso continuar a dieta quando engravidar?"
Aqui, vou dividir esta pergunta em 2:
1. É possível ganhar menos peso do que as recomendações atuais durante a gestação?
2. É possível perder peso na gestação?
Então, respondendo à primeira pergunta, em 2009, o Instituto de Medicina (Institute of Medicine) publicou as recomendações para o ganho de peso conforme o IMC antes da gestação (conferir a tabela abaixo) baseadas em estudos conduzidos na população norte-americana.
♦ Para mulheres com obesidade (IMC maior ou igual a 30 kg/m²), um ganho entre 5 a 9 kg é recomendado, independente do grau de obesidade.
Isso significa que uma mulher com IMC de 31 kg/m² (obesidade grau 1 ou leve) deve ganhar a mesma quantidade de peso do que uma mulher com IMC de 45 kg/m² (obesidade grau 3 ou mórbida), por exemplo.
♦ Aqui surge a primeira ressalva a essa recomendação: se o risco de complicações para o binômio mãe-bebê parece aumentar conforme o excesso de peso, não é possível enquadrar todas as gestantes com obesidade numa mesma categoria de ganho de peso!
♦ Outra consideração a ser feita é que sabemos que a nossa população de gestantes difere significativamente do perfil norte-americano, além do que fatores extremamente relevantes para o ganho de peso, como a idade, a paridade (número de filhos) e o tabagismo, não foram considerados nessa recomendação.
♦ Diante dessas limitações, o Colégio Americano de Ginecologia e Obstetrícia (American College of Obstetricians and Gynecologists), em 2013, sugeriu que um ganho de peso inferior às recomendações atuais, ou seja, inferior a 5 kg, pode ser benéfico em termos de redução de desfechos adversos para a mãe e para o bebê, desde que este ganho abaixo das recomendações não cause repercussões no crescimento e desenvolvimento do bebê.
♦ Em relação à segunda pergunta, é possível perder peso na gestação?
Os estudos existentes na literatura até o momento são todos observacionais (mais sujeitos a fatores de confusão na interpretação dos resultados) e, a grande maioria, não avalia os desfechos maternos e fetais pela quantidade de peso perdido. Essa heterogeneidade entre os estudos limita a comparação dos resultados descritos. Além disso, muitos desfechos maternos e fetais não foram completamente avaliados nestes estudos.
♦ Em geral, gestantes com obesidade que perdem peso durante a gestação apresentam menor risco de bebês grandes (acima de 4 kg ou acima do percentil 90) e parto cesáreo, com risco aumentado de bebês pequenos (peso abaixo do percentil 3 para a idade gestacional).
É provável que o risco de bebês pequenos seja atenuado para gestantes com maior grau de obesidade que apresentem perda de peso na gestação.
♦ Resumindo, idealmente, mulheres acima do peso que pretendem engravidar, devem fazer um programa de reeducação alimentar antes da concepção, a fim de reduzir os riscos para a mãe e também para o bebê;
♦ Para mulheres que engravidam acima do peso, o ganho abaixo das recomendações atuais ou mesmo a perda de peso durante a gestação não deve ser generalizado até que tenhamos evidências mais robustas das repercussões materno-fetais (maior risco de bebês pequenos versus menor risco de bebês muito grandes);
♦ Entretanto, naquelas pacientes com maior grau de obesidade, os riscos e os benefícios do ganho de peso abaixo das recomendações devem ser avaliados individualmente. O menor ganho de peso nestas gestantes pode ser monitorado e ajustado de acordo com o crescimento fetal;
♦ Para perda de peso durante a gestação, os estudos até o momento são muito heterogêneos e não avaliaram todos os desfechos adversos na mãe e no bebê, tanto no curto como no longo prazo. Por isso, a perda de peso não é recomendada durante a gestação.
Recomendações para o ganho de peso gestacional conforme o Instituto Americano de Medicina, 2009
Índice de massa corporal pré gestacional (kg/m2) | Ganho de peso total (kg) |
<18,5 | 12,5 a 18 |
18,5 a 24,9 | 11,5 a 16 |
25 a 29,9 | 7 a 11,5 |
>30 | 5 a 9 |
Fontes:
1. Moehlecke Milene et al. Low gestational weight gain in obese women and pregnancy outcomes: a review. American Journal of Perinatology (AJP Rep. 2016 Mar;6(1):e77-82)
2. Weight Loss Instead of Weight Gain within the Guidelines in Obese Women during Pregnancy: A Systematic Review and Meta-Analyses of Maternal and Infant Outcomes. Plos One, 2015 Jul 21;10(7):e0132650.
3. ACOG Committee opinion no. 548: weight gain during pregnancy. Obstet Gynecol 2013 Jan;121(1):210-2.
4. Institute of Medicine. Weight Gain During Pregnancy: Reexamining the Guidelines. Washington, DC: National Academies Press; 2009.
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